26 de out. de 2008

Mise en scéne

À renúncia aos amores
retribuo-te com algo que ainda não tenho.
O ato de silenciar em mim é instintivo,
um sentir quase palpável, diluído, liqüefeito.
É preciso saber colocar a topografia dos teus recantos,
enterrar e esconder o sentimento embolorado, fora do eixo.
Te condenso em letras e imagens.
Reconstruo-te das frestas:
a necessidade da completude de alento não serve.
Diáfana, toda a minha pele vibra em tremores de reminiscência.
A boca em meio ao tempo escuta um surrealismo do acaso,
traçado de maneira tão concisa quanto possível.
A concepção primordial encerrada num labirinto
se dissolve numa torrente de lágrimas.

18 de out. de 2008

Esboço


Ando meio gato
a lamber os escombros meus.
Fremo, encontro-me vazia de emoções
que em mim cabem.
Um estado de desconsideração
enquanto eu não amava: essa coisa patética, palpitante, tremula.
No entorno o silêncio é sincero-
afago meu cheiro, minha cor-
fragmentos de mim.

12 de out. de 2008

Buscadora de idéias

A par das correntes de sofrimentos indizíveis,
desenha todo o processo em linguagens estáticas.
Desprende da mesmice cotidiana:
querer os meus quereres,
devorar as estradas,
di vagar.
Avançando de mansinho, invadindo até, quando menos perceber, chegar do outro lado dele...
do caminho e do descaminho.
Ele seduz e me faz esquecer o sol.
Estou à margem de uma fronteira subjetiva,
da descoloração pessoal.
No nada contido.
Tomemos a vida
eu mudo
tu calas
depositaria palavras
na tua alma
por acaso, talvez.

De lírios


The Kiss, 1892
Henri de Toulouse-Lautrec


Em gozos simples ou intensos orgasmos
Da boca foge o beijo:
Insultos à uivar no lusco-fusco.
O universo inteiro com tudo que ele comporta,
por instantes, despenha-se.
Vou parindo no âmago, meus cacos.
Que entram pela janela
e arrastam tudo pela frente.
Ganhava contornos patológicos,
arrastando minhas malas sobrecarregadas
de cinzentos suspiros.
No fremir de toda esta cotidiana odisséia,
sorrisos imóveis.
Falta quase nada pra sentir.
Da carne que guarda,
Amor exangue.

6 de out. de 2008

Escarro

Escancarava minha existência
Se eu der minhas entranhas
confabularia de rabo ao cabo.
Apontaria os trilhos da locomotiva rumo ao desconhecido
e faria em pedaços o plano paralelo de existência.
Goles quase insanos num denso poema musicado

5 de out. de 2008

Advento

No ensejo eu o vejo poesia.
Solenidade de um desejo intenso,
feito ordinário à mesa posta.
Uma avaria que instiga e repele a sua busca egocêntrica.
Deixo-me contaminar pelos entediantes impasses
sobre estreita ponte.
Impacto profundo no tempo de menos, como eu nunca veria.
Mudam os amores em nós, desertos da ambiguidade safada.
Isso era quase um orgasmo

Livre

Trago um alvoroço de amor dentro do peito.
Meu corpo se enche de mundo, quando estás dentro de
mim. Por você desnudaria minha alma.
Alma que arrasta a minha comitiva, pouco mais que
nada, no desconcerto imperativo da dúvida.
Caminhante, sinto o chamado do mar que existia dentro
de mim como saudade.
O corpo denso da essência era o suficiente para uma
absurda felicidade.